Hoje inicia uma nova seção chamada “Knickstória” que, como o próprio nome sugere, se propõe a contar fatos e curiosidades da longa história do New York Knicks: Jogadores, treinadores, rivalidades, partidas...
E para o primeiro post, nada mais certo do que começar pelo começo!
Vamos voltar no tempo, bem antes do surgimento dos Knicks e da NBA...
“O basquetebol é o jogo da cidade. Seus campos de batalha são as tiras de asfalto entre as cercas de arame farpado ou edifícios em ruínas; seu ritmo cresce com a batida irregular de uma bola contra superfícies duras.”
Todo mundo sabe que o basquete surgiu em uma
associação cristã (conhecidas como “YMCA” ou simplesmente “Y”) de Springfield
quando o canadense Dr. James Naismith apresentou o jogo para estudantes em 1891,
mas o desenvolvimento do jogo aconteceu na região de Nova York.
Quando o basquete começou, a competição entre
universidades era muito mais popular do que profissionais que teve muitas
dificuldades para se estabelecer até o surgimento da NBA.
Era o começo do basquete profissional.
Time profissional de Trenton no começo do século XX |
No dia 7 de novembro de 1896, o time de Trenton,
liderados pelo capitão Fred Cooper enfrentou a Associação Cristã de Brooklyn no
Trenton Masonic Hall. Cada jogador do time de Trenton recebeu US$ 15,00 para
jogar, Cooper recebeu US$ 16,00 porque era o capitão.
No final, vitória do time de Trenton por 15 a um.
Trenton começou a desenvolver o jogo utilizando
passes rápidos e com o tempo dominava os times das YMCA’s. Foi nessa época que
surgiu outro time em Nova York, o New York Wanderers da associação da Rua 23 em
Manhattan. Os Wanderers foram banidos das instalações das associações e se tornaram
um time “viajante”.
Em 1898 um grupo de jornalistas esportivos se reuniu
e criou a “National Basketball League” que consistia de times do estado de Nova
Jersey e da Pensilvânia. No mesmo ano foi criada outra liga em Nova York,
conhecida como “The New York District of the National League”. Os Wanderers se
juntaram à liga que também incluía outros times como Cook’s All New Yorks,
Brooklyn Signal Corps, Fourteenth Separate of Yonkers, Bay Ridge Athletic Club
e um time do Flushing. A liga não durou muito tempo, em 1903 foi dissolvida.
Várias ligas profissionais surgiam e rapidamente
eram dissolvidas, mas vários times viajantes começavam a se destacar. Chegou ao
ponto de um deles, o Buffalo Germans, ser selecionado para representar os
Estados Unidos nos Jogos Olímpicos de 1904 em St. Louis. Foi o primeiro time
profissional americano a vencer uma medalha de ouro de basquete, 88 anos antes
do “Dream Team” em Barcelona.
Os principais times viajantes em Nova York eram
Original Celtics, Trojans of New York, New York Renaissance e, os mais conhecidos atualmente, Harlem Globetrotthers que, apesar do nome, eram formados por
jogadores de Chicago.
Formado em 1914 por Frank McCormack, o New York
Celtics tinha como sede a Amsterdam Opera House na Rua 44. O time era
basicamente composto por adolescentes que vivam em Hell’s Kitchen, lado oeste
de Manhattan.
McCormack se juntou ao exército em 1917 para
Primeira Guerra Mundial, então os irmãos Jim e Tom Furey assumiram o time, mas McCormack
se recusou a ceder os direitos do nome do time. A solução dos Furey foi
simples: removeram “New York” e chamaram o time de “Original Celtics”.
O Original Celtics se tornou um dos principais
times viajantes, tendo sua melhor temporada em 1922-23 com 193 vitórias em 205
jogos.
Original Celtics |
Os Celtics provavelmente foram um dos primeiros times
profissionais de basquete a jogar no antigo Madison Square Garden, a segunda
versão que realmente ficava na região da Praça Madison e também participaram do
primeiro jogo de basquete profissional na terceira versão do Madison Square
Garden na Rua 49. No dia 6 de dezembro de 1925 os Celtics venciam o Washington
D.C.’s “Parade Club” por 35 a 31.
Fato curioso da partida: os capitães dos dois times
foram presos após o jogo por violarem a Lei do “Sabbath” jogando num domingo.
Isso não era novidade para os jogadores dos Celtics que várias vezes eram presos
por jogarem nos domingos.
Isso não afetou a popularidade dos Celtics que cada
vez mais atraíam jogadores do país, um deles era um alto jovem de Yonkers, filho
de imigrantes eslavos chamado Joseph Bohomiel Lapchick (guarde esse nome). O time que era basicamente formado por jogadores
de origem irlandesa agora possuía membros de origem alemã, eslava e judia.
New York Rens |
Já o New York Renaissance, ou simplesmente Rens,
era composto por jogadores negros, tendo como casa o Harlem Renaissance Cassino
and Ballroom. A equipe foi fundada em 1923 por Bob Douglas que também era o
treinador do time. Seus jogos serviam como abertura para apresentações de
músicos como Count Blase, Louis Armstrong e Duke Ellington.
Apesar de serem rivais em quadra, Celtics e Rens
tinham um grande respeito mútuo. Lembrando que isso era nos anos 20 e a
realidade para os negros era muito diferente, os jogadores dos Rens sofriam
muita discriminação em jogos fora de casa. Isso motivou os pivôs dos Celtics, Lapchick,
e do Rens, Cooper a se abraçarem sempre antes do jogo começar quando os dois
times se enfrentavam. Eles queriam passar uma mensagem para ao público nas
arquibancadas.
Lapchick do Celtics e Cooper do Rens disputam a bola ao alto |
Os Rens chegaram a vencer 88 jogos seguidos e ganharam
o primeiro torneio de basquete profissional legítimo em 1939, o primeiro título
de um time profissional de basquete de Nova York, 31 anos antes dos Knicks serem campeões da NBA.
Enquanto isso, o basquete universitário se tornava
cada vez mais popular. O prefeito de Nova York na época, Jimmy Walker, chamou
os colunistas esportivos mais influentes da cidade para criar um evento para
levantar fundos para ajudar os desempregados.
Foi realizada uma rodada tripla que mudaria para
sempre o basquete. No dia 19 de janeiro de 1931 a Universidade de Nova York
enfrentou Manhattan, St. John’s enfrentou City College e Columbia enfrentou
Fordham.
O local onde o eventou aconteceu? Madison Square
Garden.
Com ingressos esgotados, Walker conseguiu US$
22.000,00 para a sua causa.
Após o sucesso do primeiro evento, no dia 22 de
fevereiro de 1933, o Garden sediou sete, isso mesmo, sete jogos no mesmo dia
atraindo 20 mil pessoas.
Ned Irish |
É nessa época que surge a figura de um jovem
jornalista do New York World-Telegram chamado Ned Irish (guarde esse nome também) que fazia a cobertura dos jogos de
basquete universitário pela cidade. Ele achava que o basquete precisava de um
local maior para ser jogado e, para ele, o “novo” Madison Square Garden que
havia aberto na Rua 49 em 1925 era o local ideal.
Fachada do velho Garden que funcionou entre 1925 e 1968 |
Irish também era relações públicas do time de
futebol americano New York Giants, mas seu principal foco era o basquete
universitário. Com o apoio do dono do Giants, Tim Mara, Irish propôs ao
presidente do Madison Square Garden, o General John Reed Kilpatrick (sim, era um General mesmo), um plano
para organizar rodadas duplas de basquete universitário no Garden.
John Kilpatrick |
Kilpatrick já havia recebido várias propostas, mas
a de Irish foi a que mais o agradou. O plano era realizar as rodadas duplas
como uma concessão, ele garantia um lucro de US$ 4.000,00 ao Madison Square
Garden – basicamente um pagamento pelo aluguel do espaço – e o resto era
dividido com Irish.
Irish seria responsável pelos agendamentos, divulgação e venda de
ingressos, desde que pagasse os US$ 4.000,00 para o Garden por cada evento.
O primeiro evento de Irish foi no dia 29 de
dezembro de 1934, uma rodada dupla com NYU enfrentando Notre Dame e St. John’s
contra Westminster. NYU venceu Notre Dame por 25 a 18, enquanto que Westminder,
uma pequena universidade da Pensilvânia, surpreendeu e venceu St. John’s por 37
a 33.
O evento foi um sucesso e rendeu muito mais que os
US$ 4.000,00 e no fim a parte que Irish recebeu equivalia a seis meses de
salário como repórter. Irish se demitiu do jornal, mas manteve seu cargo com o
Giants, isso era no começo dos anos 30, bem na época da grande depressão
americana.
As rodadas duplas de Irish atraiam cada vez mais
universidade de todo o país, assim o Madison Square Garden passava a ser
chamado como a “meca do basquete”.
Do outro lado, os times profissionais não tinham o
mesmo apoio e estava cada vez mais difícil para sobreviverem por causa da
popularidade do basquete universitário. Porém começava a surgir a demanda por
uma liga profissional legítima.
Em 1937 a General Eletric, Firestone e Goodyear
criaram a National Basketball League, que não tinha nenhuma conexão com a NBL
de Nova Jersey e Pensilvânia do final do século anterior.
A nova NBL se tornou popular no início dos anos 40
e sua primeira grande estrela era o pivô de 2,08 metros de altura George
Mikan. Curiosamente a liga não tinha nenhum time de Nova York, mas os Rens estavam na liga, convidados para jogar em Dayton, como Dayton Rens.
Max Kase |
Nos anos 40, o jornalista Max Kase tinha uma ideia de criar uma
liga profissional que utilizaria as mesmas arenas que sediavam os jogos da
National Hockey League, ele acreditava que o basquete poderia ser uma boa opção
para o uso desses locais nas noites em que não houvesse jogos de hóquei no
gelo.
Kase conhecia
Walter Brown, dono do Boston Garden que gostou da ideia e começou a entrar em
contato com outros donos de arena como Arthur Wirtz (Chicado Stadium) e Al
Sutphin (Cleveland Arena).
A liga teria times em cidades chave para garantir
cobertura de grandes jornais. Mas a liga precisava de uma franquia para ser o
grande holofote. Kase queria uma franquia que jogasse no Madison Square Garden.
Em 1946 Ned Irish se tornou o presidente do Madison
Square Garden porque Kilpatrick havia sido chamado pelo exército (o cara era um General!) e Kase entrou
em contato com ele para que pudesse comandar um time de basquete profissional
que jogasse no Garden.
Irish explicou que segundo regras da associação de
gestores de arenas o Garden teria que ser o dono do time que jogasse na arena.
Ned não estava muito empolgado com a ideia de um
time profissional, as rodadas duplas de basquete universitário iam muito bem,
mas ele viu um potencial na proposta de Kase. Além disso, ele não queria que
outra pessoa estivesse comandando um time profissional em Nova York.
Então no dia 6 de junho de 1946 no Commodore Hotel
na Rua 42 em Manhattan, Irish estava presente na fundação da Basketball Association
of America.
Composta por 11 times, o primeiro comissário da
liga era Maurice Podoloff que iniciou a chamar os donos que tinham interesse
para uma espécie de “leilão” pelo direito de ter um time na nova liga.
Maurice Podoloff |
Um por um, donos de grandes cidades como Boston,
Cleveland e Philadelphia confirmavam seu interesse na nova liga. Quando foi a
vez de Nova York, Irish informou que ele tinha o Madison Square Garden e uma
verba de US$ 3,5 milhões.
Kase ainda tentou fazer sua oferta, mas Irish o
interrompia dizendo “Três ponto cinco milhões”. Kase gritou com Irish que
utilizava sua influência para que os times ficassem com a receita dos ingressos, algo muito vantajoso para ele, ainda mais considerando que uma arena como o Garden com capacidade atrair 18 mil
pessoas para uma partida.
Apesar dos donos não estarem satisfeitos com o
ímpeto de Irish, eles sabiam a importância de ter o Madison Square Garden como
parte da liga. Dizem que Irish deu uma generosa comissão para Kase pelo seu
esforço para que a liga tivesse uma franquia em Nova York, mas Kase nunca iria
comandar um time profissional.
Ele seguiria no jornalismo esportivo e por ironia
do destino, anos mas tarde iria dar um furo no jornalismo esportivo expondo um
esquema de apostas que causou um grande escândalo na liga universitária e
afetou a popularidade do basquete universitário.
A grande beneficiada deste escândalo? A NBA, mas
isso é assunto para outro post.
Assim, Nova York tem o seu time profissional na
BAA, chega a hora de dar um nome para a equipe. Irish queria que o time tivesse
a sua própria identidade e, apesar do sobrenome, “Celtics” não era uma opção.
Logo depois da criação da BAA, Irish chamou seus
empregados em seu escritório no Garden e começaram a discutir o novo time.
Irish queria um nome que representasse a cidade de Nova York e o sua população. Cada
empregado foi instruído a trazer um nome, escrever em um pedaço de papel e
coloca-lo em um chapéu.
Depois de contar os votos, Irish tinha o nome do
seu time: Knickerbockers.
Hoje em dia pode parecer um nome estranho, mas esse
apelido tinha tudo a ver com os nova iorquinos (não se preocupe que logo vem post explicando).
O dono do Boston Garden, Walter Brown, reivindicou
o apelido para o seu time e em seguida contratou o cartunista Zang Auerbach,
irmão de Red Auerbach, para criar um duende para ser o símbolo da franquia, seu
nome era “Lucky”.
Irish também queria um personagem, para isso ele
utilizou uma importante figura política do final do século XIX e início do XX,
o “Father Knickerbocker”.
Logo original do New York Knickerbockers |
“Lucky” é o símbolo do Celtics até o dia de hoje,
enquanto que o “Father Knickerbocker” desapareceu do Madison Square Garden.
Depois dar o nome e um logo, era hora montar o
time. Para ser o treinador, Irish somente tinha um nome em mente: Joe Lapchick
(Eu disse para guardar o nome dele, não
disse?).
Joe Lapchick (direita) foi o primeiro treinador contratado pelo Knicks, mas antes terminou seu contrato com a Universidade de St. John's |
Antiga estrela do Original Celtics, Lapchick tinha
uma carreira de muito sucesso como treinador da Universidade de St. John’s. Quando
Irish entrou em contato em maio de 1946, antes mesmo da formação da nova liga,
Lapchick ficou exaltado com o convite para ser o treinador do novo time de
basquete profissional de Nova York. Irish ainda garantiu que ele seria o
treinador mais bem pago da nova liga.
Lapchick só fez um pedido a Irish: que ele
cumprisse o último ano do seu contrato com St. John’s antes de assumir os Knicks.
Irish aceitou a condição de Lapchick e então
escolheu o treinador de Manhattan College, Neil Cohalan para ser o treinador
interino da franquia em seu primeiro ano na BAA. Apesar disso, Lapchick estaria
envolvido com a franquia, participando dos treinos de pré-temporada e dos
playoffs.
O próximo passo era a seleção do elenco, o teto
salarial estabelecido pelos donos era de cinco mil dólares. Irish foi atrás de
talentos locais, a maioria dos times fez isso, pois assim era mais fácil
promover as partidas com jogadores populares das universidades locais.
O primeiro “training camp” dos Knickerbockers foi no
Nevele Country Club em Catskills. 25 jogadores foram convidados e houve uma
grande química entre os jogadores nova iorquinos como Sidney “Sonny” Hertzberg,
Ralph Kaplowitz, Oscar “Ossie” Schectman, Leo Gottlieb, Tommy Byrnes e Dick
Murphy.
Cansativos treinos foram feitos ao ar livre em dois
dias nas quadras de concreto de Nevele, o que ocasionou diversos joelhos com
cortes, mas ninguém reclamava, a nova franquia deu alimentação aos presentes e
depois da primeira semana os jogadores foram autorizados a trazer suas esposas
e filhos para se juntarem a eles no local de treinamentos.
A primeira temporada da BAA estava agendada para
começar no dia 2 de novembro de 1946. Os Knicks fariam seu primeiro jogo em
Toronto contra os Huskies no Maple Leaf Gardens, mas naquela noite estava
agendado um jogo de hóquei, logo, a partida foi antecipada para sexta-feirta,
dia 1º, e se tornou o primeiro jogo da história da BAA.
O time da casa fez o possível para promover o jogo,
mas os jornais locais não se importavam com a partida, o preço dos ingressos variava
de 75 centavos a $ 2,50. Mesmo assim não foi suficiente para lotar o Maple
Leafs, foram 7.090 pagantes sendo que a capacidade do local era de mais de
14.000.
Os canadenses não se importavam com o basquete na
época, tanto que quando o Knicks chegou na alfandega, um funcionário avistou o
grupo de homens altos e jovens e perguntou quem eles eram.
O treinador Cohalan respondeu:
“Nós somos os New York Knickerbockers.”
Isso não significou nada ao funcionário, que já viu
times profissionais passarem por lá.
“Nós conhecemos o New York Rangers, vocês são parecidos com eles?”
Cohalan respondeu:
“Eles jogam hóquei. Nós jogamos basquete.”
Informações e fotos obtidas da internet e do livro “New York Knicks: The Complete Illustrated History” de Alan Hahn.
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